Crescimento espiritual - Conrad Mbewe

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“Conrad Mbewe está certo: muitos cristãos modernos estão satisfeitos com o fato de que sua salvação está segura, mas falham em reconhecer sua responsabilidade de ardorosamente cultivar o crescimento espiritual em sua vida. Por meio de uma exposição de 2 Pedro 1, Conrad argumenta, de modo proveitoso, que Deus deu aos cristãos tudo de que precisam para crescer espiritualmente, mas a Escritura lhes ordena que cultivem fielmente o crescimento espiritual em sua vida através dos meios de graça que Deus mesmo proveu. Foi para isso que ele nos salvou, e essa busca ativa pelo crescimento terá implicações significativas tanto para a vida presente de um cristão quanto para sua vida futura. Este livro é um chamado para o despertamento altamente necessário dos cristãos modernos, muitos dos quais se tornaram espiritualmente estagnados e complacentes em sua vida espiritual.”

Scott Aniol, vice-presidente executivo e editor-chefe, G3 Ministries

“O apóstolo Pedro viveu uma vida marcante, saindo do litoral da Galileia (onde trabalhava como pescador, antes de ser chamado por Cristo) para as ruas de Jerusalém (onde negou a Cristo), para o dia de Pentecostes (no qual proclamou a Cristo) e, por fim, para Roma (onde foi martirizado pelo Evangelho de Cristo). Ambas as epístolas de Pedro revelam o coração de um terno pastor que amava a Cristo e suas ovelhas, bem como aspirava ao crescimento delas em graça (Jo 21.15). Estou transbordante de alegria com o fato de que o irmão Mbewe lançou mão de sua pena para mostrar como Pedro ensinou acerca da importância do conhecimento, virtude, domínio próprio, perseverança, fraternidade e amor por um tipo de crescimento espiritual que se baseie no Evangelho e seja centrado em Cristo. Como de costume, a escrita de Mbewe é repleta de clareza, aplicação, belos hinos, enfoque no Evangelho e ilustrações envolventes (incluindo muitas tiradas da vida na Zâmbia). Que o

Senhor use esta abordagem maravilhosa de 2 Pedro 1 para levar aqueles que estão mortos à vida e aqueles que estão vivos a um crescimento vital na piedade.”

Joel R. Beeke, chanceler, Puritan Reformed Theological Seminary

“Crescimento Espiritual, de Conrad Mbewe, é uma joia rara, que une profundidade bíblica, clareza pastoral e aplicação prática. Com base em 2 Pedro 1, Mbewe nos conduz com sabedoria pelas doutrinas e deveres do crescimento espiritual, mostrando que a fé cristã não é um ponto de chegada, mas o início de uma jornada de transformação progressiva rumo à semelhança com Cristo.

“Dividido entre os indicativos (o que Deus já fez por nós), os imperativos (o que devemos fazer em resposta) e as implicações (os frutos visíveis dessa caminhada), o livro confronta a complacência e desafia o leitor a viver uma fé vibrante, ativa e frutífera. É uma leitura ideal tanto para novos convertidos quanto para crentes maduros que desejam renovar seu compromisso com a santificação. Mbewe escreve como um pastor que ama suas ovelhas e deseja vê-las crescendo em graça e verdade.

“Parabenizo a Editora Fiel por mais uma vez servir ao povo de fala portuguesa com uma publicação fiel às Escrituras e profundamente relevante para a vida cristã contemporânea. Esta obra merece lugar em grupos de discipulado, estudos bíblicos e na leitura devocional de todos aqueles que desejam crescer à estatura de Cristo. Um verdadeiro presente para a igreja brasileira!”

Wilson Porte Jr., pastor, Igreja Batista Liberdade (Araraquara, SP); professor, Seminário Martin Bucer; autor, Um Guia para a Nova Vida e Depressão e Graça

“A igreja evangélica brasileira pode ser comparada a um grande oceano com um palmo de profundidade. Houve um substancial crescimento numérico, mas ainda falta maturidade espiritual. Este livro é um alerta e um encorajamento. Somos alertados acerca dos perigos e prejuízos da estagnação espiritual, bem como encorajados a crescer “na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2Pe 3.18). O leitor tem em mãos um precioso recurso, escrito por um pastor de almas. Conrad Mbewe é um dos meus autores preferidos e o recomendo com alegria e convicção.”

Judiclay Santos, pastor, Igreja Batista do Jardim Botânico; fundador e diretor, Pro Nobis Editora

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Mbewe, Conrad Crescimento espiritual : como alcançar a maturidade em Cristo / Conrad Mbewe ; [coordenação Michelle Almeida ; tradução Lucilia Marques]. -- São José dos Campos, SP : Editora Fiel, 2025.

Título original: Cultivating spiritual growth.

ISBN 978-65-5723-435-8

1. Amadurecimento espiritual 2. Bíblia - Ensinamentos 3. Crescimento espiritual 4. Vida cristã I. Almeida, Michelle. II. Título.

CDD-248.4

25-297151.0

Elaborado por Eliane de Freitas Leite - CRB 8/8415

Crescimento espiritual: como alcançar a maturidade em Cristo

Traduzido do original em inglês

Cultivating spiritual growth: striving for maturity in Christ

Copyright © 2024 por Conrad Mbewe. Todos os direitos reservados.

Originalmente publicado em inglês por Reformation Heritage Books, Grand Rapids, Michigan, EUA.

Copyright © 2024 Editora Fiel

Primeira edição em português: 2025

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por Editora Fiel da Missão Evangélica Literária.

PROIBIDA A REPRODUÇÃO DESTE

LIVRO POR QUAISQUER MEIOS, SEM A PERMISSÃO ESCRITA DOS EDITORES, SALVO EM BREVES CITAÇÕES, COM INDICAÇÃO DA FONTE.

As citações bíblicas sem indicação da versão foram extraídas da Almeida Revista e Atualizada (ARA © 1993 Sociedade Bíblica do Brasil). As citações com indicação da versão in loco foram extraídas da Almeida Revista e Corrigida (ARC © 2009 Sociedade Bíblica do Brasil), Nova Versão Internacional (NVI © 1993, 2000, 2011, 2023 Biblica, Inc.) e Tradução Brasileira (TB © 1917, 2010 Sociedade Bíblica do Brasil).

Diretor: Tiago J. Santos Filho

Editor-chefe: Vinicius Musselman

Editor: André G. Soares

Coordenação Gráfica: Michelle Almeida

Tradução: Lucilia Marques

Revisão: André G. Soares

Revisão de Provas: Zípora D. V. de Lima

Diagramação: Caio Duarte

Capa: Caio Duarte

ISBN brochura: 978-65-5723-435-8

ISBN ebook: 978-65-5723-433-4

ISBN audiolivro: 978-65-5723-434-1

Caixa Postal, 1601

CEP 12230-971

São José dos Campos-SP

PABX.: (12) 3919-9999

www.editorafiel.com.br

(14 de outubro de 1991 – 19 de novembro de 2023)

Nosso amado filho, cuja vida ilustrou lindamente os princípios bíblicos expostos neste livro e que, confiamos, foi plenamente recebido no eterno

Reino de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.

A Mwansa Ndemi Mbewe

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

Onde há vida, há mudança. No entanto, para que ocorra crescimento, é preciso haver um esforço deliberado. Duas pessoas podem nascer na mesma família e ser criadas juntas, mas, se uma não cuidar bem da saúde, ficará claro que enfrenta uma luta para crescer e pode até ficar doente e fraca. O que se verifica no reino natural também é verdade no reino espiritual. Duas pessoas podem vir a Cristo no mesmo ano. Dez ou 20 anos depois, uma delas ainda estará usando fraldas espirituais, enquanto a outra será um adulto maduro em Cristo, tendo uma vida espiritual frutífera e impactante na igreja e no mundo. Muitas vezes, a diferença está em quanto esforço esses indivíduos dedicaram ao seu próprio crescimento espiritual.

Muitos crentes tratam a salvação como um seguro contra incêndio — nesse caso, seguro contra o fogo do inferno. Eles estão felizes por tê-la e estarem a caminho do Céu. O fato de que precisam crescer não lhes ocorre. Pior ainda, eles não percebem que é sua responsabilidade garantir que cresçam espiritualmente. Por isso, temos tão poucos crentes que demonstram ter alcançado a maturidade em Cristo.

Era com isso que o escritor da carta aos Hebreus estava preocupado. Ele escreveu:

... e, tendo sido aperfeiçoado, tornou-se o Autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem, tendo sido nomeado por Deus sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque. A esse respeito temos muitas coisas que dizer e difíceis de explicar, porquanto vos tendes tornado tardios em ouvir. Pois, com efeito, quando devíeis ser mestres, atendendo ao tempo decorrido, tendes, novamente, necessidade de alguém que vos ensine, de novo, quais são os princípios elementares dos oráculos de Deus; assim, vos tornastes como necessitados de leite e não de alimento sólido. Ora, todo aquele que se alimenta de leite é inexperiente na palavra da justiça, porque é criança. Mas o alimento sólido é para os adultos, para aqueles que, pela prática, têm as suas faculdades exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal.

Por isso, pondo de parte os princípios elementares da doutrina de Cristo, deixemo-nos levar para o que é perfeito... (Hb 5.9–6.1a)

Foi essa tão comum falta de entendimento sobre a necessidade de crescimento espiritual que me levou a empreender este estudo de 2 Pedro 1. Nesse capítulo, Pedro descreve como o crescimento espiritual constante resulta em uma vida frutífera e piedosa: “Porque estas coisas, existindo em vós e em vós aumentando, fazem com que não sejais nem inativos, nem infrutuosos no pleno conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo” (2Pe 1.8). Reescrevendo de uma forma afirmativa, se você tiver essas qualidades em uma medida cada vez maior, elas o tornarão eficaz e frutífero em sua vida cristã. Em suma, você deve continuar crescendo. Nada pode ser mais claro do que isso!

PARTE 1

OS SINAIS DE CRESCIMENTO

ESPIRITUAL

CAPÍTULO 1

VOCÊ RECEBEU A MESMA MEDIDA DE FÉ

Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, aos que conosco obtiveram fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo, graça e paz vos sejam multiplicadas, no pleno conhecimento de Deus e de Jesus, nosso Senhor.

— 2 Pedro 1.1-2

A maioria dos jovens africanos gosta de jogar futebol. Eles jogam em casa, na escola, nas aldeias e nas grandes cidades. No entanto, quando se trata de assistir aos jogos e acompanhar as grandes ligas de futebol, a maioria está interessada nos times populares da Europa. Times como Manchester United, Real Madrid, Barcelona, Bayern de Munique, Manchester City, Chelsea, Arsenal e Liverpool são nomes conhecidos em todo o continente. À medida que a temporada de futebol vai se aproximando do fim, alguns torcedores estão eufóricos, porque seus times vêm tendo um desempenho muito bom, enquanto outros estão desanimados por causa do desempenho medíocre de seus times. No entanto, cada temporada de futebol começa com igualdade de condições,

por assim dizer. As equipes ainda não têm nenhum gol marcado nem pontos acumulados. Seus treinadores e presidentes dos clubes tiveram oportunidades semelhantes de montar a melhor equipe possível.

A corrida (ou carreira) cristã, que é outra maneira de nos referirmos à vida cristã, também é assim. Todos nós começamos com o mesmo fundamento de fé no Senhor Jesus Cristo. Ninguém tem uma vantagem inicial que garanta que essa pessoa, em comparação com seus amigos, se tornará um gigante espiritual. É isso que o apóstolo Pedro procura enfatizar na saudação que inicia sua carta.

Antigamente, de modo geral, as cartas começavam com o autor se apresentando. A razão disso está no fato de que elas eram escritas em rolos de pergaminho. O destinatário não podia olhar imediatamente a assinatura no final para saber quem havia escrito a carta para ele, como é o caso das cartas modernas. Assim, saber desde o início quem tinha escrito a carta e a quem ela se destinava fazia muito sentido quando a pessoa começava a desenrolar o pergaminho. Como acontece com a maioria das cartas apostólicas, pode-se perceber, dentro da saudação, o que estava na mente do autor quando começou a escrever a epístola.

Isso é discernível até mesmo em 2 Pedro. Como já comentamos, Pedro queria que os destinatários de sua carta soubessem que todos os cristãos têm uma fé de igual posição — sejam eles apóstolos, sejam crentes comuns. Esse conhecimento é vital se quisermos encontrar uma resposta bíblica sobre por que alguns crentes são gigantes espirituais e outros não. Temos de começar reconhecendo que todos nós começamos em pé de igualdade — precisamente com o mesmo nível de fé.

O ESCRITOR

Quem é esse escritor que nos diz que temos uma fé no mesmo nível que a dele? Ele se identifica como “Simão Pedro, servo e apóstolo

de Jesus Cristo”. O apóstolo Pedro é mais conhecido como Simão Pedro. Algumas versões em inglês usam Simão, enquanto outras usam Simeão (a variação hebraica) na saudação de 2Pedro.1 Isso ocorre porque não existiam máquinas copiadoras quando a Bíblia estava sendo reproduzida na época da igreja primitiva. Alguém ditava o que estava no documento original, enquanto várias outras pessoas, em seus próprios documentos, copiavam o que era lido. É muito possível que, ao copiar o que estava sendo ditado, alguns tenham escrito o nome grego, Simão, enquanto outros acabaram escrevendo o nome hebraico, Simeão. O que importa para nós é que o homem que se apresenta é a mesma pessoa que conhecemos, que andou com Jesus Cristo e aprendeu com ele em primeira mão.

Esse Simeão ou Simão Pedro referiu-se a si mesmo como servo e apóstolo de Jesus Cristo. A palavra grega para “servo” não é diakonos (que significa literalmente “servo”), mas doulos (que significa literalmente “escravo”). O termo se refere a alguém que não tem direitos pessoais, já que estes foram entregues a outro ser humano: o seu mestre. Enquanto um servo podia largar o emprego, um escravo não podia fazê-lo, uma vez que era propriedade de seu mestre. Toda a sua vida devia ser vivida sob a direção de outra pessoa. Era assim que Pedro entendia seu relacionamento com o Senhor Jesus Cristo. Ele era um escravo de Cristo. E é isso que todos nós somos como cristãos. Não discutimos com ele sobre o que ele quer fazer com a nossa vida. O que quer que ele diga, devemos fazê-lo. Nosso trabalho é dizer: “Que farei, Senhor?” (At 22.10). Esse é um teste importante para saber se nos tornamos, de fato, cristãos.

Pedro também se apresentou como apóstolo de Jesus Cristo. A palavra “apóstolo” significa “enviado”. Ele foi enviado pelo Senhor para

1 N.T.: As versões da Bíblia em português usam “Simão”.

fazer a vontade dele. Embora todos os cristãos sejam escravos de Jesus Cristo, não se pode dizer o mesmo quanto a ser apóstolo. Isso ocorre porque, estritamente falando, o apostolado foi limitado aos 12 indivíduos que viram e ouviram o Senhor Jesus Cristo e foram os primeiros a receber a Grande Comissão (Mt 28.16-20). Todos esses 12 já morreram. Eles lançaram o fundamento da fé cristã, sobre o qual o resto de nós está agora edificando, de acordo com os dons que Deus nos deu (Ef 2.20).

Aos apóstolos foi revelada a natureza da salvação em Jesus Cristo. O próprio Jesus passou nada menos que três anos discipulando os apóstolos, para que soubessem o único caminho para a salvação e como Deus quer que vivamos como crentes do Novo Testamento. Antes de voltar para o céu, Jesus lhes disse: “Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer” (Jo 15.15). Ao longo de três anos, todo o plano de salvação havia sido compartilhado com os apóstolos em palavras e ações, enquanto observavam e ouviam o Filho de Deus. É importante reconhecer isso desde o início deste estudo, porque significa que o que aprendemos sobre crescimento espiritual com o apóstolo Pedro não é simplesmente uma lista de ideias pragmáticas. Essa é a própria natureza da salvação, conforme revelada a ele e aos outros apóstolos por nosso Senhor Jesus Cristo. É assim que o próprio Jesus espera que cresçamos espiritualmente. Se não seguimos o que Pedro nos instrui a fazer, desobedecemos ao nosso Senhor — desobedecemos a Deus. E, espiritualmente falando, fazemos isso por nossa própria conta e risco. Pedro escreveu não apenas como nosso companheiro escravo (em total obediência ao Mestre), mas também como alguém a quem foram confiadas as próprias palavras de Deus. Devemos ouvi-lo!

OS LEITORES

Pedro afirmou que estava escrevendo para pessoas que tinham uma fé igual à sua por meio da justiça de Jesus. Nosso texto diz: “Aos que conosco obtiveram fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo” (2Pe 1.1). Quem eram essas pessoas? Se fosse a carta do apóstolo Paulo aos romanos, responderíamos: “Eram os crentes na igreja em Roma”. Da mesma forma, caso se tratasse da carta do apóstolo Paulo aos coríntios, teríamos respondido: “Os destinatários são os cristãos que constituem a igreja em Corinto”. Isso é porque Paulo menciona os destinatários logo no início dessas cartas. A epístola de Pedro é chamada de uma epístola geral porque não declara quem eram os destinatários específicos. Ela está na mesma categoria das epístolas de Tiago e João.

Mais adiante, nessa segunda epístola, Pedro escreve: “Amados, esta é, agora, a segunda epístola que vos escrevo” (2Pe 3.1). Isso significa que poderíamos obter algumas pistas sobre seus destinatários na saudação de sua primeira epístola. Nela, está escrito: “Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos que são forasteiros da Dispersão no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia” (1Pe 1.1). Ao se referir a eleitos exilados, Pedro estava falando sobre os cristãos que haviam sido dispersos pela perseguição. Ele menciona as regiões onde a maioria deles estava dispersa: Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia. Seria certo concluir que ele tinha essas mesmas pessoas em mente ao escrever essa segunda epístola. Você descobrirá que o tema do sofrimento é muito forte nas duas cartas. Os destinatários de ambas estavam sob intensa perseguição por causa de sua fé. No entanto, Pedro não apenas lhes deu conselhos sobre como permanecerem firmes em meio ao sofrimento. Ele começa sua segunda carta especificamente com um apelo para que cresçam espiritualmente. Como ele escreve mais adiante nesse primeiro capítulo,

o crescimento espiritual os manterá eficazes e frutíferos na vida cristã, apesar da perseguição, assim como impedirá que caiam e garantirá que sua entrada no Céu seja ricamente recompensada. Pedro descreve os destinatários de sua segunda epístola como aqueles que obtiveram uma fé do mesmo tipo que a sua. A expressão grega lanchano, traduzida como “obtiveram”, tem um sentido um pouco mais profundo do que a tradução sugere. Ela significa “receber” e está no pretérito. Esses crentes já receberam essa fé. Eles a têm completamente em sua posse. Em segundo lugar, a expressão sugere que os crentes eram meramente recebedores dessa fé. O doador dessa fé determinou a quem a daria; Deus era soberano na distribuição dessa fé. É interessante notar que dois outros trechos em que essa expressão grega é usada no Novo Testamento se referem a pessoas que lançam sortes (Lc 1.9; Jo 19.24).

Assim como acontece em um jogo de dados, o número que o jogador obtém está totalmente fora do seu controle. Depende da vontade absolutamente soberana de Deus. Quando Pedro usa essa expressão, ele quer dizer que não foi a decisão de seus leitores que lhes deu essa fé. Isso foi um ato de Deus. Ele os escolheu na eternidade para serem os recebedores dessa fé preciosa e, no momento certo, deu esse dom a eles, e não a outros. É por isso que, em sua primeira epístola, o apóstolo Pedro os chamou de eleitos.

Os cristãos precisam ser gratos a Deus por cada parte da nossa salvação, uma vez que nossa fé nos foi dada como um dom de Deus (Ef 2.8). Nós não fomos o primeiro motor; Deus o foi. Não somos crentes por causa de nossa inteligência ou porque alguns de nós foram criados em um lar cristão. Deus, em sua soberania, fez isso. Ele nos escolheu. Somos simplesmente recebedores de sua graça superabundante.

De acordo com Pedro, o que os crentes dispersos obtiveram?

Obtiveram uma “fé igualmente preciosa”. A fé mencionada aqui não se

refere às doutrinas do cristianismo. Não é aquilo em que você acredita, e sim o instrumento pelo qual você acredita. Quando a palavra “fé” é precedida pelo artigo definido correspondente (isto é, “a fé”), normalmente se refere ao corpo de ensinamentos em que se crê. No entanto, quando o artigo definido não está presente (isto é, uma fé), normalmente se refere ao elemento em nós que confia e crê. “A fé” é objetiva e externa a nós, enquanto “fé” é subjetiva e reside no nosso coração. No caso que estamos analisando, o apóstolo Pedro se refere a esta última, que é a capacidade dada por Deus de perceber a verdade sobre ele. Ele afirma que esse elemento é o mesmo em todos nós — quer a pessoa esteja vivendo hoje, quer tenha vivido no primeiro século. É de igual valor, de igual honra e de igual preciosidade. Não há diferença. Temos a mesma fé.

O que é ainda mais surpreendente é que, quando Pedro fala sobre essa fé que compartilhamos, ele se inclui, na qualidade de apóstolo. Lembre-se de sua introdução: “Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, aos que conosco obtiveram fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo”. Quer Pedro estivesse se referindo apenas aos apóstolos, quer aos apóstolos e outros crentes, a frase certamente o incluía como apóstolo. Podemos diferir nos dons, mas Deus nos dá a mesma fé salvadora, pela qual confiamos em seu Filho, o Senhor Jesus Cristo, para a nossa salvação. Nesse sentido, os apóstolos não eram uma categoria diferente de crentes. O mesmo Espírito Santo que abriu os olhos espirituais de Pedro e de Paulo é aquele que abriu os olhos espirituais de todos os crentes aos quais Pedro estava escrevendo. Então, por que deveria haver alguma diferença?

A base para que obtenhamos uma fé igual à dos apóstolos é o fato de que o mesmo preço foi pago pela nossa salvação e de que estamos revestidos da mesma justiça. Pedro escreve: “Aos que conosco obtiveram

fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo”. O preço pago pela fé que estava no coração de Pedro foi o mesmo preço pago pela fé de todos os verdadeiros crentes. Jesus obteve uma justiça impecável por intermédio de sua vida perfeitamente irrepreensível na terra e, então, pagou o preço pelos nossos pecados com sua morte na cruz.

Isso é um indicativo ou constatação, a declaração de um fato sobre todos os crentes. Eles obtiveram uma fé de mesmo nível que a dos apóstolos, pela justiça de nosso Deus e Salvador Jesus Cristo. Infelizmente, se você olhar para muitos crentes hoje em dia, não pensará assim. Podemos ser mais numerosos hoje, em comparação com os crentes do primeiro século, mas a espiritualidade que caracterizava a igreja primitiva está em grande parte ausente nos dias de hoje. Os crentes do primeiro século viviam sob intensa perseguição, mas resistiram ao teste do tempo. Eles impactaram o mundo com sua vida. Foram jogados aos animais selvagens para serem comidos vivos como um espetáculo para o entretenimento da sociedade de sua época.

Precisamos parar de ler o livro de Atos como se estivéssemos assistindo a um filme. Nos filmes, as pessoas estão atuando para nos divertir. Super-heróis como o Super-homem, o Homem-Aranha e a Mulher Maravilha não são reais. Nós sabemos disso. Não tentamos imitá-los porque sabemos que são apenas atores fazendo seu papel. No entanto, as pessoas de que a Bíblia nos fala foram reais, com fraquezas e fragilidades semelhantes às nossas. Elas viveram no mundo real, do mesmo jeito que nós. Passaram pelas mesmas provações que enfrentamos — ou mesmo piores. Ao lermos que eles venceram o mundo, é bom saber que a fé que os sustentou é precisamente a mesma fé que está em nós. Lembre-se: é uma fé de igual valor, de igual honra e de igual preciosidade. Não há diferença entre o que Deus fez neles e o que Deus fez em nós.

É fácil dar desculpas para a nossa indolência, ineficácia e falta de frutificação quando nos comparamos com as pessoas ao nosso redor. Nossa geração pode ser muito condescendente consigo. Justificamos nossa falta de crescimento e de frutos pondo a culpa nas pressões do trabalho e nas difíceis circunstâncias econômicas em que vivemos. No dia do juízo, quando nossos olhos puderem enxergar o que outros crentes passaram para viver para Cristo em sua própria época, nossas desculpas serão esfarrapadas demais para serem mencionadas na presença de Deus. Embora tenhamos obtido uma “fé igualmente preciosa”, eles acrescentaram à deles as qualidades de virtude, conhecimento, autocontrole, firmeza, piedade, bondade fraternal e amor, enquanto nós nos contentamos em simplesmente aproveitarmos a vida em nossa jornada espiritual rumo ao Céu.

A SAUDAÇÃO

O apóstolo Pedro cumprimentou os crentes para os quais estava escrevendo com uma oração: “Graça e paz vos sejam multiplicadas, no pleno conhecimento de Deus e de Jesus, nosso Senhor”. Essa saudação não é exclusivamente petrina. O apóstolo Paulo começa quase todas as suas epístolas desejando a graça e a paz de Deus aos destinatários de suas cartas (veja, por exemplo, Rm 1.7; 1Co 1.3; 2Co 1.2; Gl 1.3). Às vezes, ele ainda complementa essas duas com o acréscimo da misericórdia de Deus (1Tm 1.2; 2Tm 1.2). Temos bons motivos para dizer que essa era uma forma normal de saudação apostólica. Os crentes para os quais Pedro estava escrevendo já tinham a graça e a paz de Deus. A graça divina era a fonte de sua salvação e a paz era o fruto resultante. Ainda assim, Pedro orou por mais graça e paz. Ele queria que essas bênçãos de Deus fossem multiplicadas para seus irmãos. Isso só poderia acontecer de um modo: por meio do conhecimento salvador e santificador de Deus e de seu Filho.

A graça de Deus é seu favor gratuito àqueles que merecem exatamente o oposto. Merecemos a ira de Deus, mas, em vez disso, ele nos favorece. Nessa saudação, Pedro ora para que esse favor imerecido de Deus esteja sobre esses exilados eleitos de um modo mais que abundante. Como já dissemos, a paz é fruto dessa graça. Você sabe que Deus tem sido gracioso com você porque ele o enche com sua própria paz.

As duas coisas estão relacionadas como causa e efeito. Todos aqueles que são salvos do pecado terão as duas. Eles devem ser capazes de dizer: “Deus, por sua graça, salvou-me do meu pecado, e ele me deu uma paz que excede todo entendimento”.

Ao orar para que o povo de Deus tenha essa graça e paz em abundância, Pedro pede que eles conheçam a energia dada por Deus, a qual resulta em sustento e crescimento espiritual. Foi disso que o apóstolo Paulo falou quando escreveu: “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo; por intermédio de quem obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes; e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus” (Rm 5.1-2). A justificação pela fé resulta em paz com Deus e põe os crentes em um contexto em que Deus lida com eles com graça e de uma forma contínua, o que resulta em sua alegria permanente e em uma esperança ousada. Essa é a essência da oração que Pedro faz em sua saudação.

É essa energia divina, mediada pelo Espírito Santo, que nos permite correr espiritualmente, enquanto outros ficam atolados na lama. Ouça o apóstolo Paulo mais uma vez: “E não somente isto, mas também nos gloriamos nas próprias tribulações, sabendo que a tribulação produz perseverança; e a perseverança, experiência; e a experiência, esperança. Ora, a esperança não confunde, porque o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo, que nos foi outorgado” (Rm 5.3-5). Era isso que Pedro queria ver

naqueles crentes perseguidos. Pedro desejava que eles se regozijassem em seu sofrimento e crescessem por causa dele.

Em certo sentido, portanto, é disso que dependemos totalmente para progredir na vida cristã. Precisamos da presença permanente do Espírito Santo para nos dar cada vez mais de sua graça e paz enquanto enfrentamos novos desafios dia após dia. É isso que nos fará deixar de ser crianças espirituais que chupam o dedo para nos tornarmos adultos maduros em Cristo, apesar das circunstâncias adversas em que nos encontremos. Isso é o que nos fará parar de nadar na parte rasa de nossa própria piscina doméstica e passar a nadar no oceano da vida, sem afundar.

Pedro diz que essa graça e paz se multiplicam “no pleno conhecimento de Deus e de Jesus, nosso Senhor”. Nosso Deus é verdadeiramente um Deus trinitário! Quando encontramos uma das pessoas da Divindade, não demora muito para percebermos que estamos lidando indiretamente com as outras duas. Isso também acontece aqui. Em sua saudação, Pedro diz: “no pleno conhecimento”, mas, no versículo 3, diz: “pelo conhecimento completo” (veja também 2Pe 2.20). A graça e a paz vêm a nós por intermédio do Espírito Santo, mas vêm por causa do conhecimento de Deus e de Jesus, nosso Senhor. Esse é o conhecimento doutrinário e experiencial que nossa fé apreende no momento de nossa salvação e durante o processo de nosso crescimento e santificação.

Consequentemente, quanto mais conhecimento temos, mais profunda é nossa experiência de vitória espiritual. Isso prenuncia a razão pela qual Pedro mais tarde exortará os crentes a associarem conhecimento à sua virtude e fé (v. 5). Falaremos mais sobre isso no próximo capítulo. Por enquanto, basta dizer que você não pode experimentar a graça e a paz permanentes de Deus em superabundância enquanto seu conhecimento a respeito dele ainda é superficial. Você precisa crescer em seu conhecimento de Deus.

Nossa fé está em pé de igualdade com a dos apóstolos e a dos cristãos da igreja primitiva. Todos nós começamos no mesmo nível, com a mesma fé. O que gera a diferença de maturidade entre você e outros crentes é o quanto você leva a sério o seu crescimento espiritual. Você está deliberadamente se esforçando para conhecer mais a Deus? Você arranjou tempo para participar dos cultos e do estudo da Bíblia na igreja? Você tira tempo para ler a Bíblia e bons livros cristãos? Quero encorajá-lo a analisar novamente as suas disciplinas espirituais, porque a graça e a paz que você experimenta em sua vida cristã são determinadas em grande parte pelo que você faz para conhecer a Deus. Isso não acontecerá de forma automática. É preciso que você tenha esse propósito e reserve tempo para se dedicar a ele.

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